Independência de quem? Alunas da Escola vão às finais da Olimpíada de História, focada no tema.

“Será o bicentenário da Independência,
mas independência de quem?”

Quem indaga é Lara, a respeito do bicentenário do Brasil, que se festeja em 2022. “Nada é o que parece.”

Lara é uma das 3 participantes da equipe “Tainha e Pureza” da Escola da Ilha, que vai para as finais da Olimpíada Nacional de História do Brasil, em agosto. O bicentenário da independência é o tema único do evento.

A final, não é para qualquer um: se classificaram 415 das 9.400 equipes – quase 28.000 alunos – que iniciaram a competição. Em Santa Catarina, apenas 2 das 188 equipes inscritas. A equipe “Tainha e Pureza” – Alícia Flores Possamai, Lara Corrêa Konrad e Manoella Debiasi Dos Anjos, da 2ª série do Ensino Médio -, ficou em 1º lugar no Estado, o que já é tradição (aconteceu em 6 das 7 últimas edições).

Com a palavra, as três alunas e a professora que as acompanhou, Michele Moraes, que entregaram a última tarefa dois minutos antes de se encerrar o prazo.

“Foi difícil, foi cansativo”, declaram todas as três.

Manoella“A gente sempre participou, desde o oitavo ano, mas este ano teve uma pegada muito forte. Estamos na segunda série, a gente tinha dúvidas se participava, porque tem uma carga muito grande de atividades, mas a gente puxou uma à outra, ‘é a última chance de participar, vamos, vamos’. Quando era presencial, tinha uma sala para se reunir, um pensamento muito junto. Mas com a pandemia e todas as restrições, a gente precisava ficar numa sala do zoom. A gente ficava ali conversando, quase todos os dias, até uma ou duas da manhã, lendo e discutindo os textos. Todas as fases foram muito difíceis, mas na quinta fase [semi-final], tinha um texto muito difícil. É um aprendizado que a gente vai levar para o resto da nossa vida.”

Alícia: “Foi o único ano em que eles realmente focaram no mesmo tema, deram todas as questões baseadas nisso. A quinta fase foi a mais complicada de todas as que eu participei, desde 2018. Necessitou que a gente fizesse quatro textos, quatro imagens, quatro descrições de imagens, muita pesquisa, eles publicaram vídeo-aulas, o que foi diferente também. Foi muito cansativo, mas foi uma ótima experiência.” 

Lara: “Talvez também porque a gente amadureceu este ano, de todos, acho que foi o mais intensivo, justamente por ter um tema tão específico, por ter um foco que você procura em tudo, foi algo muito imersivo, a gente estava muito consumida naquilo, pensando naquilo, fazendo aquilo.”

Michele: “Elas tiveram que construir uma exposição sobre a independência do Brasil, como se fosse uma sala de aula, e preencher quatro paredes de sala com textos, informações, imagens pesquisadas, imagens construídas por elas. Foi extremamente enriquecedor pensar a história por um outro viés, que não esta, da história consagrada, sacralizada, do grito do Ipiranga e tudo mais. Se debateu o papel dos museus, o papel das fontes históricas, das vozes silenciadas nesse processo de independência, ao longo destes centenários de independência.

Independência de quem?” indaga Lara, interrompendo a professora.

Michele: “… é, independência de quem, para quem… Eles direcionaram o tema para preparar os estudantes para as propagandas e os festejos que vão vir, e entender que a independência é um processo bastante complexo, bastante plural, que foge do mito do grito do Ipiranga, de uma passividade da população brasileira, para pensar o que é a identidade brasileira…”

Manoella: “Todas as questões foram pensadas para fazer com que a gente criasse um senso crítico sobre este acontecimento, em todas as suas facetas, em todas as outras coisas que se relacionem com o tema.”

Lara: “E, como sempre, dialogar sobre as permanências dos eventos históricos.” [Manoella: “eventos mais de manutenção do que de mudança”.]. É vendida uma imagem de uma independência instantânea, heroica, [Manoella: pacífica também], do grito do Ipiranga, muito retumbante, como diz o hino. Mas nada é o que parece. Tem que olhar nas entre linhas, procurar nos bastidores, porque essa história é uma narrativa muito bem construída”

Manoella: “Você tinha um contexto, você tinha uma América Latina inteira se emancipando e se tornando uma república. No Brasil, o governo se viu frágil, ameaçado… Então, a gente vê que que aquele grito ‘independência ou morte’ que é sempre pautado como algo heroico, que conseguiu emancipar o Brasil, para que o Brasil tivesse liberdade, foi pensando para manter todos os privilégios e os benefícios que a nobreza tinha.”

Alícia: “Continuou a mesma coisa. A gente percebe nas elites de cada região, tem sempre as mesmas pessoas no poder, sempre brancos, homens, religiosos, das mesmas famílias. Quando a gente foi fazer a pesquisa sobre Santa Catarina, a gente percebeu o quanto as mesmas famílias estão presentes em tudo, estão, até hoje, no poder”

Michele: “A gente trabalhou muito sobre as questões sociais da independência, sobre os diversos movimentos sociais que aconteceram, na época, em diversas províncias. A gente deixou de ser colônia para se tornar uma nação independente, porém, uma série de pilares de nossa sociedade permanecem, a estrutura social e política, permanece enraizada.”

 “O grande debate, nas Olimpíadas deste ano, era: até que ponto o Brasil de fato é um Brasil independente hoje.”, conclui Michele.  

A ONHB está em sua 13ª edição e é aberta para professores e alunos dos ensinos Fundamental (8º e 9º ano) e Médio de escolas públicas e particulares de todo país, organizados em grupos de 3 alunos, acompanhados por um professor. São realizadas seis etapas online, de uma semana, com questões de múltipla escolha e realização de tarefas. A cada etapa, a equipe organizadora fornece uma gama de documentos, vídeo-aulas e referências a partir dos quais os alunos organizam seu trabalho. A sétima etapa é a final, que, em tempos normais, é realizada em Campinas (este ano será, também, online).

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