LITERATURA QUE VIRA FILME

“Se fizerem um filme sobre os livros de Machado de Assis, dispenso da prova.”

Esse foi o desafio dado pelo professor Robson Gomes da Silva aos alunos da 2ª série do Ensino Médio de 2016 (terceirão desse ano). Eles aceitaram.

Resultado? Dois longa-metragens com adaptações cinematográficas dos clássicos da literatura brasileira, “Memórias Póstumas de Brás Cubas” e “Dom Casmurro”, apresentados no 1º Telão Literário da Escola da Ilha, realizado no CIC, dia 05 de abril de 2016, com sala lotada.

Durante meses, os alunos se reuniram, redigiram o roteiro, reescreveram os diálogos, encenaram, buscaram os cenários e os figurinos, filmaram, escolheram uma trilha sonora, editaram os letreiros, montaram…

A Escola se dispôs a realizar uma sessão especial na maior sala que temos… Eles não aceitaram: queriam uma sala de cinema real, com telão, cadeiras estofadas… Podíamos recusar?

No dia da projeção, o cinema do CIC estava lotado com a presença dos pais e amigos dos alunos realizadores dos filmes, professores, coordenadores e diretor da Escola da Ilha, que foram prestigiar as produções cinematográficas.

A proposta do projeto Telão Literário era fazer com que os alunos se envolvessem no universo de Machado de Assis, mergulhassem nas histórias, revisitassem os diálogos e os adaptassem para uma linguagem audiovisual, que é a mais próxima deles”, explica o professor Robson. “Se conseguirmos despertar o interesse das pessoas para a leitura das obras de Machado por meio desses filmes, teremos alcançado o nosso objetivo”.

O fato é que a produção dos filmes foi realizada no lugar de uma prova comum de literatura e aparentemente parecia ser uma troca mais tranquila para os alunos. “Foi bom fazer o filme, mas a verdade é que foi muito mais trabalhoso, levou dois meses para ser finalizado”, revela o editor/aluno Gabriel Donadel.

Durante todo o processo do filme, a família inteira se envolveu na produção, desde as caronas até as locações das filmagens e também na escolha do figurino”, explica Rafaela Manhães Andrade, irmã de Eduardo Andrade, ator/aluno protagonista de “Dom Casmurro”. Ansioso com a estreia do filme, Eduardo revela: “Fiz o meu melhor para o meu personagem, adorei participar das filmagens e conhecer mais a fundo a obra de Machado de Assis”.

O ator principal de “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, João Santos Abrão, contou que já havia atuado em outros projetos, mas que “este foi muito legal de fazer com a turma, pois todos se envolveram de alguma forma”.

A mãe da aluna Ana Júlia Melo, Ana Lúcia Garcez, pontuou: “Estou surpresa com a desenvoltura dela no trabalho de adaptação do texto do livro para o roteiro do filme, nunca a imaginei fazendo esta atividade com tanto entusiasmo”.

A família do aluno Pedro Meditsch, diretor de “Dom Casmurro”, também estava na expectativa de assistir ao filme. “Desde os dez anos, o Pedro produz audiovisuais, inclusive um curta-metragem realizado por ele aos 12 anos fez parte da Mostra dos Pequenos Cineastas no Rio de Janeiro, e agora ele está com dois trabalhos para serem lançados ainda este ano”, explica orgulhoso Eduardo Meditsch, pai do diretor.

Para Pedro, que há anos estuda na Escola da Ilha e atua na área cinematográfica, o filme “Dom Casmurro” foi diferente de suas demais produções, e pontuou: “O mais desafiador foi trabalhar com uma equipe de amigos, sem dúvida é um sonho antigo que estou realizando”.

As diretoras de “Memórias de Brás Cubas”, Giulia Brocardo e Juliana Passos, consideraram “inovadora a proposta da escola e uma experiência sensacional dirigir um filme”. Emocionada com o recebimento da “estatueta do Oscar”, Giulia ressaltou: “Apesar de todas as dificuldades encontradas durante a produção, sinto que hoje, no lançamento dos filmes, estamos todos sendo coroados com essa exibição no cinema”.

Luis Felipe Guimarães Soares, professor de cinema na UFSC, cujo filho estudou na Escola, esteve presente para comentar os filmes. Extraímos de seu longo depoimento, no dia seguinte, um pequeno parágrafo que merece ser reproduzido.

“A seriedade e a determinação com que a gurizada se jogou ao trabalho, muito claras nos filmes (principalmente no Brás Cubas), me encantaram, não pelo aspecto moral (enquanto valores pras crianças), mas pela sensação de mergulho numa investigação corajosa das profundezas da vida. O Bê [filho, ex-aluno] tinha uns 5 ou 6 anos quando me perguntou: ‘pai, dá pra ultrapassar o tempo?’  “Vocês sabem como a gente fica diante duma situação dessas, né? Respondi modestamente algo do tipo, ‘não sei, filho, isso é complicado etc’. Agora vejo esses adolescentes, no Ensino Médio, muito mais perguntas do que respostas surgindo, encarando pra valer ninguém menos do que Machado de Assis, e a pergunta central deles parece aquela: ‘é possível superar o tempo, ultrapassá-lo, ir além dele?’ É essa também, claro, a pergunta que Brás Cubas nos coloca, de certo modo derrotado por ela. E é delicioso ver os adolescentes encarando-a assim, com seriedade, ainda que sem a menor cerimônia.”

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